Wednesday, December 15, 2021

Rogério Samora


As mortes podem ser tristes. Dizer que as mortes são tristes, assim, categoricamente, é falso. A morte está ligada à tristeza. Mas a morte de alguém em particular pode gerar em algumas pessoas apenas indiferença. Por isso a utilização de poder ser triste. Quando a pessoa deixa de existir, deixa de contar enquanto está viva, ao morrer acontece o quê? Nada. Claro que há aquele fenómeno de as pessoas serem muito boas e fazerem muita falta quando morrem. São só palavras. Os mortos deixam sempre um grande vazio. É mentira. Quem não existe em vida não pode deixar vazio nenhum. É da Física! 
Hoje morreu finalmente Rogério Samora. Depois de meses alheado do mundo, partiu definitivamente. E para mim esta é uma das mortes mais triste de que tenho memória e não apenas porque gosto dele como actor. É porque, como fui lendo, o pai dele, embora vivo, devido a doença não sabe que o seu filho morreu. Há depois um irmão de quem se começou por dizer que estava zangado com RS e não queria saber do seu estado. Depois foi dito que não seria assim, não se sabia era do seu paradeiro. E cheguei a ler que não se sabia se este irmão estaria vivo ou morto. Ou seja, se já é triste "não ter família" quando se está vivo, é mais triste não a ter quando se morreu. Mas há um primo, que não conheço, mas pelo qual sinto uma grande admiração. Um primo que foi presença assídua junto do seu familiar, não o deixando mais sozinho do que ele já estava, a dormir na cama do hospital. Há qualquer coisa de muito triste quando nos abandonam quando estamos doentes, mas quando estamos mortos... Haverá, claro, todos os colegas. E eles já se começaram a manifestar. Admiro-os. 
Um dia morreu uma colega minha, 46 anos, com mãe e pai, mas doentes, sem autonomia. Não havia mais ninguém de família. Então, foram os colegas que trataram de tudo. Inclusive arranjar um lar para os pais e um lar para o gato. Foram os colegas que decidiram que a urna não devia ficar aberta durante o velório e foram os colegas e os alunos que foram ao funeral e choraram na igreja. O choro, aliás, foi mais por parte dos alunos. Os professores choraram porque viram os alunos chorar. Foi uma coisa muito triste. Um morto abandonado é muito triste. Um bocado poético, também, e belo, até. 
Nesse dia, decidi que não queria ter funeral, nem velório, nem missa de corpo presente, nem nada. Já deixei as minhas colegas avisadas a esse respeito e já falei até com a minha mãe. Não fora a pandemia e já teria contactado a funerária que ficará responsável por mim. Mas não perderei muito mais tempo...
Quanto a Rogério Samora, terá o seu primo junto dele. E os colegas. E as homenagens de quem gosta dele. Eu gosto dele. E fiquei a gostar mais quando o senti meio abandonado em vida e meio abandonado agora...

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