Saturday, June 20, 2020

Le Silence de la Mer


Um Homem vai vivendo. Vai enfrentando a vida, como pode. Aparentemente tem sucesso. Aparentemente está feliz. Na rua, nas revistas, nas "redes", está feliz. Nas redes, toda a gente está feliz. Ou atormenta de forma soez os que estão felizes. Os obstáculos, as pequenas angústias, o pensar no futuro, o pensar como continuar a ser feliz e a ter sucesso no futuro, tudo aquilo que nos aperta um pouco, que nos sufoca, só se manifesta no palco vazio da nossa mente. Não falamos porque o nosso interlocutor mais imediato se aflige. E não queremos afligir o outro. E não temos ninguém a quem possamos contar o pequeno drama que se vai desenrolando no nosso íntimo. A depressão vai-se confundindo com uma pequena crise. A crise da meia idade. A crise das outras idades. O encurtar de tudo, de tempo, de oportunidades, de amigos. Alguns deixaram-nos devido aos nossos sucessos - pequenos sucessos -, porque não suportam que tenhamos subido um degrau. Não importa qual. Outros nunca sequer foram nossos amigos. E demonstraram-no, posto que sempre nos viraram as costas nos momentos mais frágeis. Mas nós não queríamos acreditar. Nós esperávamos que fosse só um momento, que não se repetiria. Nós não sabíamos que a nossa existência, e tudo que nela existe, era visto como uma espécie de parasitismo. Para nós termos, o outro deixou de ter. A nossa existência teve como contraponto uma série de inexistências e de raiva acumulada dirigida a nós. E nós não sabíamos. Embora saibamos que não foi assim...
E um dia um Homem olha em volta e não vê nada que valha a pena. Já ultrapassou a angústia de pensar na angústia dos outros. Já não vê nada. Já arranjou coragem para dar um fim ao psicodrama da sua mente. Só quer dirigir-se para o mar. O mar grande, onde já nadou, onde já foi feliz. É para o mar que se dirige, mais uma vez, a última, em busca de ser feliz. Pela última vez.

Descansa em paz, Pedro. Podias ter dito alguma coisa, íamos os dois. 

Imagem: Beksinski

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