Friday, September 07, 2018

Tumular...


Ontem e hoje, depois de vir do local de trabalho, digamos assim, cheguei a casa moribunda. Parece que tinha andado a cavar. Sentia como se não tivesse sequer esqueleto, ou como se este estivesse a dissolver-se. Tinha que comer alguma coisa, porque a mudança de horários -a hora de levantar, a hora de comer, etc. - me põe num estado de quase estranhamento do meu corpo. Não me conheço, assim como quase não reconheci alguns colegas: estão mais velhos, visivelmente mais cansados e alguns estão numa fase de desencantamento abissal (eu, por exemplo: velha, cansada, desencantada, sem saber aonde ir buscar forças…). E aquela que foi sempre a pessoa mais optimista que eu conheci apareceu como no dia em que nos despedimos: adoentada. Fez exames e mais exames…
A outra - uma de entre muitas/os com depressões - desde que teve aquela doença, aliás continua a ter, ficou instável. Ignorou-me olimpicamente por três vezes, nos últimos tempos, o que muito me custou, porque não era coisa que ela me tivesse alguma vez feito - e eu não sou de ferro, e na altura ainda menos. Agora, no entanto, ontem, mas sobretudo hoje, sempre focada em mim, falando como se nada fosse. Pergunto-me como será a próxima vez que nos reencontrarmos, por altura de alguma reunião. Felizmente, trabalho na noite e num sítio pouco frequentado, de portas bem aferrolhadas, pelo que raramente me cruzo com "os outros". Daquilo que depender de mim, procurarei evitá-la, para ficar com a impressão de amizade que hoje partilhámos…
Mas, dizia eu, depois de findo o dia de trabalho, a chegada a casa tem sido quase a gatinhar, a arrastar-me. Hoje, por exemplo, ainda tentei motivar-me para sair e fazer umas compras, coisas de que preciso. Mas não. Fui deitar-me e, tanto ontem como hoje, caí num sono tumular. Um sono tão pesado, que dir-se-ia que o meu corpo, sem esqueleto, corria o risco de fazer um buraco na cama, ir por ele fora e desaparecer, parando apenas num sítio de tal modo duro, que fosse impossível perfurar. Acordada de tal sono, fica uma sensação de náusea e de dor de cabeça...

De repente, vem-me à memória a personagem de Mia Couto que, quando se deita, retira a pele e os músculos, como se de uma roupagem se tratasse, colocando-a depois no ramo de uma árvore. Se eu pudesse fazer isso e se viesse alguém e me levasse a pele… e o resto.

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