Sunday, August 07, 2016

George Gissing


Depois de GG não consigo ler nada com prazer. Nada! Deixei um livro de Chesterton a meio, claro que vou terminá-lo um dia destes, mas apenas porque sim. Sinto falta dos romances realistas de Gissing, da forma como dá conta das grandes transformações, em todos os sectores da sociedade, ocorridas em Inglaterra na segunda metade do século XIX.
Como ainda não organizei bem as leituras, ainda não cruzei dados, etc., não posso dizer sem sombra de dúvida que GG era um "apocalíptico" que a custo se foi tornando um "integrado", embora pouco. Com ele, deixei de gostar de livros que pouco vão além da história contada com perícia literária. Aqueles livros que se demoram nos pormenores, porque não têm pressa de revelar o que quer que seja, ou tão pouco de o ocultar. Estou a pensar no romance The Man in the Window, de Jon Cohen. Foi um bom livro, com um título cativante: eu própria sinto-me "uma mulher à janela". É daí apenas que me relaciono com o exterior. É um livro que leva o seu tempo, que não é pouco, a narrar tudo o que envolve o enterramento da personagem que morre logo na primeira página: que feliz forma de começar, hein? Cativou-me logo. É também um livro cheio de sofrimento: o homem desfigurado à janela, a enfermeira obesa mórbida que trabalha com doentes terminais, o homem velho que teme aquilo que a velhice trará ainda de pior (e a situação dele já não é famosa: surdo e com falhas de memória), etc. Mas não há um rebolar na dor, por assim dizer. Não há um choradinho ininterrupto e miudinho como a chuva que molha tudo, até os parvos. Não: tem até muito humor, humor negro, ironia amarga, mas enfim, humor. A primeira gargalhada que dei foi ao ler a seguinte passagem.
Vou enquadrar primeiro. A viúva não quer gastar rios de dinheiro com os preparativos fúnebres do defunto, principalmente porque o agente funerário é conhecido por espremer os entes enlutados até à medula. A viúva, porém, escaldada, responde do seguinte modo à sugestão feita acerca da indumentária do falecido:
«My husband, I guarantee you, Mr. Rose, does not wish to travel through eternity in a necktie and a pair of shiny shoes pressing on his bunions.» (Cohen, 2013: loc. 130)

Eu não resisto à palavra joanetes (bunions) :)!

Mas, dizia eu, sinto falta de realidade, de personagens reais, palpáveis, com muito contexto histórico, narradas de forma "objectiva", não floreada, não cómica, contida. Gissing não está para nos fazer rir. E eu, que gosto de autores que me façam rir, viciei-me em Gissing, na sua seriedade, na sua sobriedade, na forma fascinante como nos leva a conviver com todas as classes sociais da época e em variados espaços: dos bairros miseráveis dos pobres, a cair de bêbedos nas "public houses", às casas da aristocracia decadente e da burguesia ora endinheirada e boçal, ora endinheirada e digna.
Tenho que rebuscar todas as Amazons, pode ser que ainda haja um livrinho, um só, que eu ainda não tenha lido.


2 comments:

Romi said...

Lá fiquei eu com a pulga atrás da orelha. Não conhecia o senhor, talvez me cruze com ele numa livraria perto de mim. Obrigada pelas sugestões ...

Adélia Rocha said...

Está na Amazon, a preço zero, pode baixar-se a aplicação kindle no computador e ler, sem pagar nada. Mas está em inglês.