Saturday, May 15, 2010

Solidão: um poema

ATROPELAMENTO E FUGA

Era preciso mais do que o silêncio,
era preciso pelo menos uma grande gritaria,
uma crise de nervos, um incêndio,
portas a bater, correrias.
Mas ficaste calada,
apetecia-te chorar, mas primeiro tinhas que arranjar o cabelo,
perguntaste-me as horas, eram 3 da tarde,
já não me lembro de que dia, talvez de um dia
em que era eu quem morria,
um dia que começara mal, tinha deixado
as chaves na fechadura, no lado de dentro da porta,
e agora ali estavas tu, morta (morta como se
estivesses morta!),olhando-me em silêncio estendida no asfalto,
e ninguém perguntava nada e ninguém falava alto.

de Manuel António Pina

...(Lindo!)

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