Saturday, October 15, 2016

Aqui jaz...


... tudo o que é superior, belo, bom.
Dá jeito ter uma conta no Facebook, para armazenar e enviar textos de que gostamos. É bom também como identificação para entrar em determinados sites. E há comunidades com as quais temos afinidades e nas quais estamos a salvo das torrentes infindas de ódio, má educação e "grunhice". E ignorância da pior espécie: aquela que julga tudo saber. Encontrar amigos? Os amigos afastam-se nos maus momentos, nas dificuldades, quando fazem falta. Logo, não há necessidade de os ter. Mas, a meu ver, os inconvenientes são bem mais numerosos. Ler comentários no FB é uma experiência limite, aterradora. Ontem, a propósito do Nobel da "literatura"/internacional cançonetismo, houve enxurradas tóxicas de entulho verborreico. Mas o que me surpreendeu, ou talvez não, foi a "opinião" de dois cronistas que costumava admirar: o MEC e o João Pereira Coutinho. Estranhamente, ambos babaram com a escolha da Academia (de) sueca. Claro que estão no direito de admirar as letras ou poesia escritas e cantadas por Bob Dylan e de o afirmarem. O que me espanta é a forma como o fazem. Vejam:

1-
 «Dantes toda a literatura se dividia em categoriazinhas de merda – canções, contos, ensaios, reportagens, ficções, peças teatrais, poesia. O júri do Nobel tem feito o enorme favor de voltar a confundir tudo. (...) Escrever é escrever. Um mau poeta será sempre pior do que um bom jornalista. Dylan é inegavelmente um grande escritor. A Academia sueca está a usar o Prémio Nobel para restaurar a literatura. Tomara que regresse à literatura oral. »  MEC

https://www.publico.pt/culturaipsilon/noticia/bob-nobel-nem-menos-1747246, 13 Outubro, 2016

Tomara, sim, que se volte à literatura oral, com o alto patrocínio da única instituição idónea para falar de Literatura, a Academia (de) sueca: é a forma de haver "leitores". De ouvido, lê-se melhor.

2-
«De vez em quando, um amigo escritor comunica-me, em tom conspirativo: ‘Fulaninho de tal anda a trabalhar para o Nobel.’ O ‘fulaninho’ em questão é sempre um escriba de língua portuguesa que tenta publicar prosa ‘humanista’ e ‘universal’, ao gosto da Academia. Por outras palavras: um farsante. (...) Quando ouvi o anúncio, brindei a Dylan. E lamentei pela vida perdida dos farsantes.» JPC

http://www.cmjornal.pt/opiniao/colunistas/joao-pereira-coutinho/detalhe/trabalhar-para-o-nobel?,utm_medium=Social&utm_source=Facebook&utm_campaign=BotoesSite&utm_content=facebook,  14 Outubro, 2016

Farsantes! Em boa verdade, "farsante" até foi das palavras mais meigas que li para falar dos escritores.

Acho patético que dois colunistas, tanto quanto sei conservadores de direita, estejam tão eufóricos pela malha que a academia sueca deu aos literatos, esses finórios, que não escrevem nada que se entenda pelos comuns mortais. Soa mal. Parecem aquelas pessoas - nas quais me incluo por vezes, triste é dizê-lo - que não se vestem de acordo com a idade que têm, ou que, calvos no alto da cabeça, usam contudo um farfalhudo rabo de cavalo. Estão a ver? Isto, sim, é ser farsante, parece-me... e ridículo.
Nada tenho contra B Dylan, que aliás, e bem, ainda não agradeceu à Academia. Queira Deus que ao menos ele continue igual a si próprio, rebelde, senhor de si, anti-establishment, e não receba o prémio. Haja alguém que ponha ordem no caos, que respeite as "categoriazinhas de merda", vulgo trabalho incansável de teóricos, críticos e amantes de literatura durante séculos.
A propósito, a melhor coisa que li esta semana foi um verso de Dylan que dizia mais ou menos isto, cito de cor, «ninguém é livre, se até os pássaros estão presos ao céu». LINDO!

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