Friday, October 28, 2016

Inquietação


Tenho usado imagens de Beksinski para ilustar textos que exprimem as minhas inquietações. Há uma série de artistas que recorrem aos seus sonhos/pesadelos para criarem arte. Para mim, Beksinski é o mais notável, mas há outros. Eu tento escrever aquilo que sonho e grande parte dos momentos felizes dos meus dias são passados a recordar paisagens que vi, por onde deambulei, de noite, enquanto dormia. Quando acordo, pergunto para mim: o que é que eu sonhei? E fico de olhos fechados a tentar recordar. Quando surge alguma coisa, uma imagem, fico ali, concentrada, quieta, à espera que surja tudo. Por vezes, não é preciso perguntar nada. É como se todas as paisagens, todas as viagens fantásticas pela noite me acordassem e me pedissem: pensa em nós! E eu penso. Eu tapo a cabeça, e revivo tudo, invento até, acrescento mais e o tempo passa e eu estou feliz. Quando acordo finalmente e tenho de abrir os olhos e ver a luz do dia, fico logo sozinha a fazer coisas pragmáticas: limpar, cozinhar, lavar roupa; preparar aulas. Não gosto da realidade... nem um bocadinho.
A semana passada, que acabou ontem, com (não interessa), foi muito inquietante. A realidade é cheia de sustos. Deixa-nos vulneráveis. Deixa-nos mesmo, literalmente. Abandona-nos, sai de nossa casa fechando a porta. Nem diz adeus. Para ali ficamos. Para ali fiquei até ontem. Agora espero ficar algum tempo sossegada, até que a realidade me venha de novo inquietar...

Imagem: http://zdzislawbeksinski.blogspot.pt/2010/05/great-artworks-of-beksinski-1976.html, consultado em 23 janeiro, 2016

Saturday, October 15, 2016

Aqui jaz...


... tudo o que é superior, belo, bom.
Dá jeito ter uma conta no Facebook, para armazenar e enviar textos de que gostamos. É bom também como identificação para entrar em determinados sites. E há comunidades com as quais temos afinidades e nas quais estamos a salvo das torrentes infindas de ódio, má educação e "grunhice". E ignorância da pior espécie: aquela que julga tudo saber. Encontrar amigos? Os amigos afastam-se nos maus momentos, nas dificuldades, quando fazem falta. Logo, não há necessidade de os ter. Mas, a meu ver, os inconvenientes são bem mais numerosos. Ler comentários no FB é uma experiência limite, aterradora. Ontem, a propósito do Nobel da "literatura"/internacional cançonetismo, houve enxurradas tóxicas de entulho verborreico. Mas o que me surpreendeu, ou talvez não, foi a "opinião" de dois cronistas que costumava admirar: o MEC e o João Pereira Coutinho. Estranhamente, ambos babaram com a escolha da Academia (de) sueca. Claro que estão no direito de admirar as letras ou poesia escritas e cantadas por Bob Dylan e de o afirmarem. O que me espanta é a forma como o fazem. Vejam:

1-
 «Dantes toda a literatura se dividia em categoriazinhas de merda – canções, contos, ensaios, reportagens, ficções, peças teatrais, poesia. O júri do Nobel tem feito o enorme favor de voltar a confundir tudo. (...) Escrever é escrever. Um mau poeta será sempre pior do que um bom jornalista. Dylan é inegavelmente um grande escritor. A Academia sueca está a usar o Prémio Nobel para restaurar a literatura. Tomara que regresse à literatura oral. »  MEC

https://www.publico.pt/culturaipsilon/noticia/bob-nobel-nem-menos-1747246, 13 Outubro, 2016

Tomara, sim, que se volte à literatura oral, com o alto patrocínio da única instituição idónea para falar de Literatura, a Academia (de) sueca: é a forma de haver "leitores". De ouvido, lê-se melhor.

2-
«De vez em quando, um amigo escritor comunica-me, em tom conspirativo: ‘Fulaninho de tal anda a trabalhar para o Nobel.’ O ‘fulaninho’ em questão é sempre um escriba de língua portuguesa que tenta publicar prosa ‘humanista’ e ‘universal’, ao gosto da Academia. Por outras palavras: um farsante. (...) Quando ouvi o anúncio, brindei a Dylan. E lamentei pela vida perdida dos farsantes.» JPC

http://www.cmjornal.pt/opiniao/colunistas/joao-pereira-coutinho/detalhe/trabalhar-para-o-nobel?,utm_medium=Social&utm_source=Facebook&utm_campaign=BotoesSite&utm_content=facebook,  14 Outubro, 2016

Farsantes! Em boa verdade, "farsante" até foi das palavras mais meigas que li para falar dos escritores.

Acho patético que dois colunistas, tanto quanto sei conservadores de direita, estejam tão eufóricos pela malha que a academia sueca deu aos literatos, esses finórios, que não escrevem nada que se entenda pelos comuns mortais. Soa mal. Parecem aquelas pessoas - nas quais me incluo por vezes, triste é dizê-lo - que não se vestem de acordo com a idade que têm, ou que, calvos no alto da cabeça, usam contudo um farfalhudo rabo de cavalo. Estão a ver? Isto, sim, é ser farsante, parece-me... e ridículo.
Nada tenho contra B Dylan, que aliás, e bem, ainda não agradeceu à Academia. Queira Deus que ao menos ele continue igual a si próprio, rebelde, senhor de si, anti-establishment, e não receba o prémio. Haja alguém que ponha ordem no caos, que respeite as "categoriazinhas de merda", vulgo trabalho incansável de teóricos, críticos e amantes de literatura durante séculos.
A propósito, a melhor coisa que li esta semana foi um verso de Dylan que dizia mais ou menos isto, cito de cor, «ninguém é livre, se até os pássaros estão presos ao céu». LINDO!

Thursday, October 13, 2016

Literatura



É hora de ir dormir e sossegar a minha indignação. A internet está cheia de especialistas a falar sobre literatura, sobretudo (ou talvez não) a rir dos escritores que pensavam que iam ganhar um prémio e - bem feito!! - não ganharam. Ganhou-o um cantor, compositor, letrista, etc.! No último comentário que li, alguém dizia que ALA não sabia escrever. Facto: afinal há muitos mais leitores e amantes de livros, quer dizer, canções, do que aquilo que se pensava.

Pessoalmente, estou-me nas tintas para a aflição daqueles que deploram o facto de cada vez se ler menos e de não se "cultivar" - como se os livros fossem couves - o gosto pela leitura. Quero lá saber! Quem não lê que não leia, a ver se eu me ralo. Eu quero é que haja livros para EU ler. Mas livros de escritores, à séria, daqueles que hoje foram ultrapassados por quem deveria ter ganho antes, com toda a justiça, um Grammy!



Deixa-me recordar, só para ver se eu consigo dormir, uma frase de Nuno Júdice:



«Não: não tenhamos vergonha de ser elitistas, herméticos, aristocratas, literatos, intelectuais, e tudo o que nos queiram chamar. E é precisamente neste ponto que reside o centro da questão: a defesa de uma literatura que se tem de manter, no meio dos destroços e de vandalismos, como sempre se manteve ao longo dos tempos, desde que o primeiro poema ou a primeira narrativa surgiram com o primeiro homem.»


Já respiro melhor!



Bob Dylan





Música linda! Prémio Nobel da Literatura? Não... Não? Não! Não.

O que diria Dwight McDonald? E Harold Bloom? E outros?

Obrigada Bob Dylan, pode ser que este prémio faça surgir um "debate" sobre a Literatura. De qualquer modo, parabéns.

Saturday, October 08, 2016

A Modernidade Líquida


Local de trabalho, supostamente, claro. Mas, quem diria? O colaborador/trabalhador/recebedor de um ordenado no fim do mês, qual trambolho, está estiraçado, de calções, com as pernas  esqueléticas, peludas e assaz ridículas, atiradas para cima de um equipamento que para ali está. Ou seja, está de perna ao alto, quiçá para cuidar da circulação, posto que passa a jornada de "trabalho" de traseiro alapado e as pernas como se sabe (eu já disse), enquanto enfia o nariz afiadíssimo no telemóvel e dedilha as teclas. É isto. O lapuz chega ao "trabalho", refastela-se, põe os membros ao alto (os visíveis, os outros, ou melhor, outro deve estar incapaz de levantamento mesmo que com auxílio... presumo) e ali fica calado, pasmado, de olhos no ecrã, sem fazer nenhum. A besta!
Entra o trombas, esbaforido, já está atrasado, comme d'habitude, e por isso nada diz: nem bom dia, nem boa noite. O animal. Lá vai o grande "educador", professor, "setor", engenheiro dormir, presumo, mas desta vez sentado. Ele também dorme em pé, diga-se. Aliás, em questões que envolvam cerrar as pestanas, é ele um especialista, capaz das mais acrobáticas proezas. Quando a preguiça e a burrice e a falta de modos tiverem prémio, ele será largamente premiado... on a daily basis. A besta.
Sai o pensador, pensa ele, posto que não tem equipamento para semelhante tarefa. O ar de enfado obtuso tresanda. Tem sempre um "pensamento", indigno desse nome, para partilhar. O seu discurso, digamos assim, à falta de pior palavra, carregado de queixumes vários, parvoíces muitas, patetadas todas e abundantes invocações, em vão, à justiça e outras coisas parecidas, atroa os tímpanos de quem o rodeia até ao massacre. Quando ele se cala, o que ocorre apenas esporadicamente, todos se ajoelham e agradecem ao Senhor. Quando ele fica retido em função de doenças, aborrecimentos e outras maçadas, reza-se uma novena e há até quem, em desespero, queira inclusive fazer um pacto com o maligno, só para não ter de lhe pôr o olho em cima outra vez. Jamais. Nunca. Em tempo algum.
Assoma a paspalha, que se orgulha de tudo aquilo de que se devia envergonhar. Um momento: não chamei besta à besta do parágrafo anterior. Queiram ter isto em consideração, antes de continuarem a leitura. A referida personagem, que apodei de paspalha, e bem, gosta de sentenciar com grande atabalhoamento, diga-se. Logo: sentencia, balbucia, murmura, debita, bota faladura, etc., enfim, deixando muitos, incluindo eu, à beira da insanidade, do corte de pulsos, do arrancar de cabelos - os dela, principalmente. A besta!
E lá do canto espreita a do cabelo ligeiramente em forma de esfregona de marca branca. É uma tonta que não diz nada de jeito, nadinha. E ri. Ri especialmente quando não há razão nenhuma para tal. Mas ela não distingue. Ela só quer rir para todos verem que ela não podia estar menos aí, seja para o que for. Ou seja, ri porque goza o tempo todo com toda a gente, principalmente com ela, posto que quem muito ri pouco urina, como diz o Povo... ai não, é chorar. Não faz mal. Entendam como quiserem. O certo é que ela ri, goza e urina. Não exactamente por esta ordem. A besta!
E a outra, e a outra... que horror... e mais a outra... e eu ali, tão cheia de saúde mental e vigor, a esvair-me no meio de tanto estrume!
Posto isto, já não será hoje que falo de "modernidade líquida", de forma mais teórica e aprofundada, com base no ensaio Culture in a Liquid Modern World , da autoria e Zygmunt Bauman. E se ele fala bem da origem das bestas! Vejam:

«What makes modernity "liquid"... is its self-propelling, self-intensifying, compulsive and obsessive "modernization", as a result of which, like liquid, none of the consecutive forms of social life is able to mantain its shape for long. "Dissolving everything that is solid " has been the innate and defining characteristic of the modern form of life (...).» (2011: loc 183).

Modernização: a besta!

Imagem: http://ociosocurioso.com.br/horror-surrealista-artista-cria-fotos-que-irao-te-causar-alguns-pesadelos/, consultado em 6 de Outubro, 2016
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Tuesday, October 04, 2016

Viva a República!


Obrigada geringonça por teres reposto o FERIADO do 5 de Outubro. Claro que eu sou republicana, mas também gosto muito de ter um dia, ao meio de semana, para ficar na minha casa.
Hoje o dia é cheio e com muitas coisas desagradáveis, mas é tudo mais "aguentável" porque amanhã, se eu não for entretanto desta para melhor, não tenho de sair e enfrentar o dia.

Saturday, October 01, 2016

Cansaço


Os outros cansam-me tanto. Se eu pudesse estar sempre sozinha! Trabalhar sozinha, não ter que falar, abraçar, "ser simpática". Mas hoje, não basta fazer um trabalho de forma honesta, empenhada e sobretudo respeitadora. Não. As pessoas querem simpatia, informalidade, "tu cá, tu lá". É um cansaço, é tudo um cansaço muito grande...