Friday, February 21, 2020

Vasco Pulido Valente


Ligo o computador e aparece "Morreu Vasco Pulido Valente". Corri para o Público, para me certificar. E depois para o Observador. Lá estava a notícia.

Não sei se foi através de O Independente que conheci VPV. Penso que sim. Foi quanto bastou para nunca mais deixar de "o seguir". Seguir alguém, afinal, não é um exclusivo das redes sociais. Creio ter lido tudo o que publicou nos jornais. Foi por ele que comecei a ler o Observador, e acabei assinante e depois, quando ele foi para o Público, comecei a assinar o Público online, também. As crónicas do Expresso eram-me dadas por um amigo que lê este jornal.

Lembro também uns programas de conversa na rádio. Ele, de facto, não tinha grande dom da palavra oral. Mas, mesmo assim, era de longe o meu favorito. Creio que estava também o Paulo Portas e um outro senhor, de quem não me recordo agora. Eram momentos épicos. A minha vida, sempre muito cheia de contrariedades, encontrava nestes programas momentos de pura submersão. Riso e esquecimento. Contava os dias e as horas. Depois, eram as aparições na televisão. Lembro-me bem da sua parceria com Manuela Moura Guedes no controverso Jornal das Sextas, se não estou em erro. Durou pouco, infelizmente.

A acrescentar a isto, há o romance Glória: genial!

Deixa-me levantar e procura-lo na minha biblioteca. Achei.Comprado em 13/11/2001. Começa assim:

«No dia 7 de Maio de 1870, um sábado, José Cardoso Vieira de Castro passou por casa por volta das quatro e meia da tarde.»

Assinalei a página 189, que muito me fez/faz rir: o "adorado portento", o "portentoso orador", "não sem antes se 'dilatarem muitos afectos'", "após o ágape", etc.. Vou reler.

VPV era inteligente, provocador, dizia tudo o que tinha a dizer sem poupar nas palavras. Era também muito irónico, sarcástico, impiedoso. Fazia-me rir. Às vezes tento encontrar quem escreva como ele. Vem-me à cabeça um nome ou dois, mas falta-lhes a cultura e a sabedoria que tornavam os textos de VPV únicos.

Não vai haver mais crónicas dele no Público. Acabou. Vou sentir falta. Muita.

O meu querido Vasco faz parte da "família" que eu própria construí para mim. Diz-se que a família não se escolhe. Mentira. Eu escolhi uma família. O Vasco era o meu irmão mais velho. E morreu!

Descansa Em Paz! Meu irmão.

Thursday, February 20, 2020

Mar Adentro



A eutanásia foi aprovada no Parlamento. Veremos o que se segue.
Os cartazes e os apelos de "não nos matem", sintomáticos da falta de informação DELIBERADA de quem não quer olhar para a morte, não auguram nada de muito bom. Mas, para já, os deputados da nação souberam entender os apelos daqueles que são pró-eutanásia.

Não posso deixar de fazer aqui umm parêntesis para falar da família. Muito se falou acerca de que aquilo de que os que sofrem necessitam é do apoio daqueles que os amam, a família e os amigos. A facilidade com que se toma a família como um dado adquirido. A facilidade com que se assume que todos têm quem os ame. Clamava a antiga líder do CDS_PP: «não me matem, ajudem-me!»
A facilidade com que se acredita que todos têm quem os ajude. Não é verdade! Eu conheço gente que não tem. Até conheço uma amiga assim...

LK, professor brasileiro, historiador, grande comunicador, numa das suas palestras diz o seguinte: pensemos em Adão e Eva. Viviam ambos no paraíso e só tinham de respeitar uma única regra. Pois bem, não se contiveram e infringiram-na. Como castigo, foram expulsos e condenados a viver humanamente, isto é, com dificuldades. Tiveram dois filhos. Eram, pois, uma família pequena, de quatro pessoas. E que acontece? Um irmão mata o outro. É esta a primeira família, a mais próxima de Deus. Um casal de pecadores, um homicida e um cadáver. Isto, acrescenta LK, deveria fazer-nos pensar.

Claro que faria. Mas "natural" é as famílias darem-se bem, ajudarem-se, apoiarem-se, pensam os simples e aqueles que têm a sorte de ter tais famílias.

Há quem esteja só, especialmente nos maus momentos. Há quem peça ajuda e não a obtenha. Há famílias assim.

Mas não quero gastar o meu tempo, hoje, com inevitabilidades. As coisas são como são. Quando tudo falta, há o Estado. E hoje os senhores deputados tomaram uma decisão que me faz muito feliz, porque me dá a esperança de que eu tenha a quem pedir ajuda, se dela necessitar.

Obrigada, Senhores Deputados! Deram-me alegria, felicidade e esperança.




Tuesday, February 11, 2020

Cuidados Paliativos????


E ali estava o meu pai, numa cama, já "sem vida", sem fôlego, mas com um braço descontrolado, de tal modo que teve de ser amarrado às grades da cama.
Um zumbi com um braço demasiado activo.
Em redor, mais umas quantas cama. Umas três ou quatro. Uma televisão. Todos tinham familiares em redor. Tudo triste. Eu era a familiar do meu pai. O coração soterrado sob camadas e camadas de dor. O meu pai era o único, felizmente, que não estava em si. Estava meio demente. Não conhecia as pessoas. A funcionária - obrigada minha querida senhora pela sua humanidade e dedicação - que dava apoio ao meu pai, dava-lhe algo líquido num copinho próprio para crianças, segurando-lhe a cabeça contra o seu peito, tudo fazendo para que ele não sufocasse.
E ele queria água, água, mas não a engolia…
E a odisseia para o internar na unidade de cuidados paliativos? Não vivesse eu na Covilhã e ele, o meu pai, não teria conseguido sequer ter acesso a esses cuidados. Por motivos burocráticos e de organização territorial, claro.

Não quer cuidados paliativos quem quer a EUTANÁSIA, e eu e muitos queremos esta última. Tratem dos cuidados paliativos e de todos os cuidados possíveis e imaginários, mas deixem os outros morrer em paz. Pelo menos isso, dado que a vida se tornou um carnaval contínuo de indignidade, crueldade e indiferença.

Paliativos? My ass!  

Saturday, February 08, 2020

Eutanásia, seminário e animais em vias de extinção


Os jornais, com a aproximação da data em que a eutanásia vai ser debatida no Parlamento, enchem-se de amáveis filantropos, que clamam pela inviolabilidade da vida humana e outras coisas igualmente bondosas. Há pessoas que só se lembram do seu próximo e querem preservá-lo por estas alturas. No resto do ano, comportam-se com a indiferença e, até, o desprezo costumeiros.
Hoje estive num seminário e falei sobretudo com gente que não conhecia. De resto, fiquei sozinha - e bem - ou quase durante as horas que durou a função. Só digo isto, porque aconteceu hoje e ainda não me esqueci. Aliás, eu não me costumo esquecer de NADA. Mas o desprezo dos pares, dos mais chegados, que se tornou rotina, não precisa ser lembrado, na medida em que se faz presente diariamente.

Voltando à eutanásia. Os amigos da vida humana - digamos -, como se não fosse suficientemente inquietante mais uma arremetida parlamentar à eutanásia, ainda tiveram más notícias oriundas da Holanda, aliás, Países Baixos. Este país extraordinário - digo-o do fundo do coração, sem sombra de ironia - prepara-se para permitir que cidadãos com mais de setenta anos, que estejam cansados de viver, possam suicidar-se tomando um comprimido disponível gratuitamente nas farmácias. Mais, um destes filantropos contou que até a uma mulher de cinquenta anos «perfeitamente saudável» foi permitido morrer. Dizia um deles, numa crónica dilacerante, que a esta gente que quer morrer - como eu - deve é ser dado pelo Estado amparo e solidariedade fraterna. Etc., etc.

Entretanto, acabado o dia, exausta e perplexa por motivos vários, vejo a imagem acima. Um homem está dentro de um rio a caçar cobras para preservar os orangotangos, ameaçados de extinção, quando um destes animais o vê e lhe estende a mão, para o ajudar a livrar-se de um lugar tão inóspito…

Se a solidariedade fraterna fosse um orangotango, talvez os países não tivessem que legislar a prescrição de comprimidos letais para a cura do cansaço de viver  …  mas não é. Ponto final.

Monday, February 03, 2020

... but the best ships are friendships



Olha, o Garfield tem um coraçãozinho bondoso… Gatinho lindo!!