Eu tinha partido
em busca de uma casa invulgarmente bela que vi uma vez, de forma fugaz,
enquanto dormia. Eu lembrava-me que tinha andado durante muito tempo num
caminho muito acidentado, hostil e cheio de poeira. Era um lugar de tal forma
deprimente que decidi esquecer-me dele, e foi nessa altura, na ânsia de ver
algo bom e belo que avistei, ao longe, uma casa. Fiquei por isso, durante muito
tempo, quieta e silenciosa olhando a casa. Ela ficou quieta e silenciosa também
e deixou amavelmente que eu a observasse. Dela, porém, não retive um só
detalhe. Não sei sequer se era grande ou não. Era apenas bela e eu procuro-a
desde então, todas as noites, nos meus sonhos, porque sinto saudade.
Pensei que devia
começar por encontrar o caminho deprimente, mas foi impossível encontrá-lo.
Tive então consciência de que estava num pinhal muito denso. Todos os pinheiros
eram da minha altura, alguns mais baixos, e todos eles, sem excepção, estavam
carregados de cerejas amarelas. Parei. Por momentos, desejei permanecer ali
para sempre, encantada com a beleza do local. Fechei os olhos. Quando os abri,
a paisagem tinha mudado. À minha frente, estendia-se uma planície imensa. Tudo
era terra escura e desolação. Depois, fui descobrindo rectângulos de pedra
branca, como túmulos. Eram túmulos. Depois começaram a erguer-se do chão
estátuas e cruzes brancas, umas de pedra outras de ferro. Havia também flores
artificiais sem cor. Toda a planície, a perder de vista, era um cemitério
desolado e belo. De repente, senti um aroma quente de café. Virei-me. Atrás de
mim, tinha-se formado uma enorme esplanada cheia de um movimento lento mas
intenso. Os clientes, todos homens muito velhos, estavam sentados, cada um à
sua mesa, bebendo café. Havia também uma mulher, mas essa parecia adormecida.
No seu colo, dormia também um gato e sobre a sua mesa, como um prodígio,
crescia uma flor branca e frágil com as pétalas, puras como seda,
permanentemente agitadas por um vento impiedoso e invisível. O empregado de
mesa aproximou-se de mim, apontou-me uma mesa junto a um túmulo discreto e, com
um sorriso, disse:
- "Vai
querer café, certamente."
Eu respondi:
- "Não.
Procuro uma casa."
Ele ficou
desiludido e mudo e eu disse:
- "Existe
por aqui uma casa?"
E ele disse
novamente com um sorriso:
"Vai querer
café, certamente."
Eu sorri para
ele e não disse mais nada. Virei-me e continuei o meu caminho. Estava novamente
num sítio com árvores muito baixas e muito densas, mas agora sentia-me
impaciente. Protegi os olhos e fui abrindo caminho, com violência, incomodada
com o choque da vegetação por todo o meu corpo. De repente, ficou tudo vazio e
amplo outra vez. Eu estava junto a um lago de um verde leitoso. No meio dele,
estava uma casa vermelha com grandes janelas, através das quais a noite entrava
e permanecia. Sentei-me no chão. Queria terminar ali a minha viagem, contemplar
a casa durante muito tempo e descobrir se era ela a casa extremamente bela de
um sonho passado. Ouvi, então, um barulho leve e tímido. Virei-me. Atrás de
mim, como uma orquestra, estavam os clientes velhos e solitários, as
sepulturas, a senhora adormecida, o gato também adormecido, a flor branca e
frágil e o vento impiedoso e invisível. Ao meu lado, alguém disse:
- "Vai
querer café, certamente".
Fiquei feliz,
tomei o meu lugar na mesa junto ao túmulo discreto e disse:
- "Certamente".
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