Friday, April 09, 2021

O Príncipe

 


Morreu o Príncipe Filipe. Hoje, a Rainha ficará sem o seu companheiro de sempre. Seguramente alguém que representava, junto dela, um mundo para sempre passado. Um mundo feito de silêncios, de privacidade, de uma verdadeira ou fingida dignidade. Sem ele, a rainha ficará cada vez mais mergulhada num mundo de vozearia, de irmãos/netos desavindos, de espetáculo, de incumprimento das mais básicas regras da educação e elegância. 

Faz-me lembrar o mito da mulher que quis ser jovem para sempre. E assim foi. Ela manteve-se imutável, enquanto tudo à sua volta se foi tornando mais e mais diferente. Farta, incapaz de se identificar com o mundo em constante mutação - para pior - implorava para morrer. Para desaparecer. Quem sabe continua a implorar, incrédula e nauseada, perante os actos dos boçais, dos prepotentes, dos ingratos, dos manipuladores, dos hedonistas, dos negacionistas de tudo.

Todos os que perdem alguém ficam mais sós. A Rainha ficará, parece-me, não só sem o seu Príncipe, como sem o mundo deles.

Não costumo lamentar as perdas daqueles que são privilegiados. Se o fizesse, como poderia conformar-me com as perdas daqueles que nada têm? Como poderia suportar essas perdas? As dos pobres de tudo, os deserdados, os esquecidos, os sem-abrigo, sem amor, sem tudo. Seria insuportável. Mas a Inglaterra é a mãe da "língua do mundo civilizado": o inglês. A língua que estudo, que ensino e que tornou o meu mundo - pequenino, limitado - num espaço infinito e sem fronteiras. Sem a língua inglesa, seria também uma indigente completa. Não teria nada. Por isso, como cumpre agradecer ao que tornou a nossa viagem pela terra uma coisa suportável, algo que nos inibe de implorar para desaparecer, como a mulher para sempre jovem do mito, estou hoje a lamentar a morte do Príncipe Filipe. Ou melhor, a lamentar a perda da Rainha, que ficará, a partir de hoje, irremediavelmente só. 

2 comments:

julio césar said...

o meu pai tambem foi assim. morreu a sua rainha e agora ele ja esta velhinho. morrer com 100 anos è bom. o meu pai tem 83 mas parece que me vai enterrar, nada contra e haja Deus. bom è ter alguèm para amar e amar. o amor è que nos salva. sem amor nada vale um caralho. amo vc sem nada.

Adélia Rocha said...

Amor? As pessoas movem-se por interesses. É questão de sobrevivência. O único amor verdadeiro é o da ficção. Não existe. Amo você!!