Thursday, December 26, 2019
Siiiiiiiiiiiim?
- Sou eu...
- Ah, fulano de tal...
- Conheceste-me logo!
Não foi difícil, mas ele reage como se tivesse sido algo absolutamente extraordinário. Bem, já há muito que não falávamos. Aliás, que ele não falava e eu ouvia.
Pude perceber que a curiosidade dele acerca de mim é zero. Depois da terceira frase que ele ignorou e ficou a meio, desisti. Ainda disse uma frase, no entanto, em voz tão alta que ele não teve outro remédio senão ouvir. Todo o prédio deve ter ouvido, aliás. E, como habitualmente, ele falou e falou. Política, política, algoritmo de não sei quê, creio que sobre a felicidade, ou coisa do género, educação, ensino, política educativas - foi aqui que eu berrei a frase de grande efeito, com o intuito de o tirar do delírio teórico-abstrato do costume -, poemas escritos, súbita veia poética sobre o tema do universo ou da energia do universo ou coisa que o valha. E também muito name-dropping e, acrescento, book-dropping. Einstein para aqui e o não sei das quantas para ali. Sobre nós, só as doenças. Vá lá, não se falou do tempo. E, a propósito de doenças, como não poderia deixar de ser, alertou-me para todos os perigos da medicação que ando a tomar. E perguntou também se os médicos me alertaram… Enfim! Como se eu precisasse que me fizessem um desenho! Como se eu não soubesse ou não tivesse capacidade para me informar acerca de qualquer tema, mas qualquer tema mesmo. Nada de novo. Continua a achar-me uma idiota e a dizer-me condescendentemente que eu sou uma pessoa muito inteligente.
Faça eu o que fizer, estude eu o que estudar, nada tem retorno. Nada me é reconhecido. Passo pela vida das pessoas, e elas não vêem nem quem eu sou, nem o que eu faço a pensar nelas. Sou invisível. Não sou inócua, porém. Aborreço o meu semelhante com extrema facilidade...
Voltando ao telefonema. O meu bom amigo - que até é, verdadeiramente amigo, afinal foi com ele que contei em momentos maus da minha vida …, nos bons momentos é fácil ser bom moço... - ainda me deu alguns conselhos. Ele acha que eu ando à procura da felicidade. Meteu-se-lhe isto na cabeça! Não ando! Eu só quero que não me aborreçam. Não acredito em felicidade! Mas, como ele não tem pachorra para me ouvir, tira conclusões precipitadas e estapafúrdias. E, como se acha cheio de recursos de etiologias várias, exortou-me a fazer duas coisas: uma para me tratar dos problemas da alma e a outra para os problemas do corpo. A saber: ler o livro X sobre felicidade e ingerir diariamente 3g de salsa!
3 gramas de salsa. Para o que uma pessoa está guardada.
PS: a minha felicidade, digamos, está muito dependente dos presentes que passei a oferecer-me mensalmente. Ele criticou o liberalismo o capitalismo e o consumismo. Está bem abelha. Fosse eu capitalista e o meu consumismo seria bem mais liberal.
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