Sunday, February 28, 2016

A Noite Passada






A noite passada, assinei finalmente a petição pela legalização da eutanásia. O que é morrer com dignidade? Haveria tanto para dizer sobre dignidade, mas não há tempo… Pessoalmente, dispenso a questão em torno da dignidade. Quero apenas poder morrer antes de chegar a minha hora. Se for caso disso, claro!

Gostei do artigo da revista Visão: “O Mercado Negro da Eutanásia”, sobretudo porque traz declarações da minha querida Laura Laura: « (…) Os medicamentos não fazem nada, ou melhor, só me fazem mal. Os que podem funcionar deixam-me zombie, drogada de tal forma que não consigo ler nem escrever. Assim, esta não é a minha vida. (…) Só peço o direito a não morrer aos bocadinhos.» Não sabia que Laura Laura estava já nesta fase tão má… Entretanto, a discussão sobre a dignidade da vida continua, surda aos apelos dos que não querem morrer aos bocadinhos… Eu, por exemplo, conseguiria viver sem os meus livros? NÃO! Afinal, nenhum livro ainda saiu mudo, da minha casa, sem conseguir esconder o desagrado pela minha presença. Claro que os livros não têm pernas: precisamente! Adiante.

Ah, o título “mercado negro” aponta, claro, para a paranóia daqueles que estão mortinhos para ir desta para melhor e, consequentemente, daqueles que aproveitam para fazer negócio à custa destes mortinhos.

Andei, também, a noite passada, a espreitar as caixas de comentários. Sempre que me apetece ser insultada, pumba, caixa de comentários. E, claro, fui logo chamada de saloia – se todos os portugueses são saloios, eu também sou portuguesa, logo, sou saloia. Alguém declarou, igualmente, que detesta todos aqueles que não leram O Guardador de Rebanhos. Eu não li! Ainda estive para ir passear para outras caixas de comentários, as da pesada, aquelas que nos enchem a barriga de nomes, mas decidi que o insulto Light já me tinha deixado bem compostinha.

Que mais fiz? Comprei livros. Um de Galileo, outro sobre Galileo, outro sobre doze Césares, um thriller arrepiante – espero bem que seja! – e outro sobre … deixa cá ver… sobre qualquer coisa palpitante. Nem mais. Tenho, entretanto, que encomendar ensaios sobre bestsellers, para fazer aquele trabalho de investigação sobre...coiso e coiso…hummmmmmm… Grande ideia que eu tive. Espero que ninguém mais tenha tido!

Vi também o Governo Sombra e aprendi o que é uma “tuta”, mas não digo.

Depois, limpei e hidratei a pele, deitei-me e adormeci com o tablet poisado sobre o peito.

É tudo.


Saturday, February 20, 2016

Umberto Eco


Que estranha é a forma como a morte nos surpreende. Ontem mesmo, após me ter sido comunicada a morte de alguém que conhecia, que era meu aluno, com quem tinha estado há quinze dias, fui, incrédula, procurar o nome no placard que anuncia o nome dos que faleceram. Incrédula estava também uma colega minha, que, no momento em que nos foi comunicada a notícia, estava a corrigir um trabalho dele. Ficámos desconcertadas, ela já nem conseguiu escrever os sumários. Saímos de imediato da escola, de noite, dez minutos antes da nossa hora de saída, tendo eu ficado de lhe enviar uma mensagem dizendo se o nome dele fazia parte do rol dos mortos. Não fazia. Porém, como verifiquei que havia luz na Igreja, dirigi-me para lá, entrei, vagueei pelo espaço vazio e, tendo ouvido vozes, dirigi-me à zona de velórios: tinha necessidade de ver aquela cara pela última vez! Mas era uma senhora - que descanse em paz -, não era o meu aluno. Enviei a mensagem à minha colega e dirigi-me para a minha casa, com vontade de escrever. Mas não escrevi.
Escrevo agora, porque ouvi o anúncio de que Umberto Eco tinha morrido. Parei tudo, peguei no computador: eu tinha que falar deste Homem que cheguei a ouvir, em Coimbra, Na Faculdade de Letras, na altura em que saiu o Nome da Rosa. Este Homem, que me tem acompanhado sempre, que foi uma referência na escrita da minha tese, que deu, aliás, um impulso decisivo para que fossem levadas a sério as obras da literatura/ cultura popular, de massas, é tão real para mim, dói-me tanto a sua morte, como a deste aluno com quem tenho convivido há quase dois anos. Umberto Eco é aquele intelectual, génio, sábio, autor de várias obras que tenho na minha biblioteca. No entanto, na altura da sua morte é "apenas" alguém de quem sentirei a falta, duma forma que me é algo estranha, pois não sou pessoa de sentir falta de ninguém...
Morreu, pois, este meu amigo de longa data. Em Maio será publicada a sua última obra. Terei, então, ainda mais uma oportunidade - a última - de falar com ele...